A Cúpula CELAC-UE avança sua agenda compartilhada com a declaração de umPacto Birregional sobre o Cuidado
- Natalia Escoffier
- há 2 dias
- 6 min de leitura
Escrito para a Rede EULAS e a Fundação EU-LAC. Saiba mais: https://eulacfoundation.org/es/difusion/blog-eu-lac
Revitalizar o diálogo birregional e a emergência do cuidado como prioridade política
Dois anos após a Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da União Europeia (UE) e da CELAC em Bruxelas, a cidade de Santa Marta sediou um novo encontro em 2025, retomando assim as conversas birregionais depois de um intervalo muito mais curto que o anterior. Nesse contexto, e apesar da ausência de muitos líderes de ambas as regiões, a nova cúpula concluiu com resultados concretos que contribuem para continuar moldando a cooperação conjunta em um mundo cada vez mais conflitante.
Um dos resultados mais significativos foi o lançamento do Pacto Birregional sobre o Cuidado. Trata-se de uma declaração que, embora não vinculante, possui um potencial substancial para enfrentar —utilizando a terminologia amplamente empregada pelas Nações Unidas— um dos principais nós estruturais da desigualdade de gênero em nível global. Nesse sentido, vale destacar que o documento que estabelece o Pacto birregional foi endossado por unanimidade pelos 27 Estados-membros da UE e por 16 dos 33 países da América Latina e do Caribe (ALC) —Colômbia, Barbados, Belize, Brasil, Chile, Costa Rica, República Dominicana, Equador, El Salvador, Granada, Guatemala, Honduras, México, Paraguai, Trinidad e Tobago e Uruguai—, que se comprometeram explicitamente a aprofundar sua parceria sobre cuidado por meio de uma série de princípios acordados.
Observando a história recente, embora o trabalho birregional tenha mantido certas continuidades durante os oito anos de hiato entre as cúpulas de 2015 e 2023, a realização de um novo encontro em Bruxelas não havia sido suficiente para formalizar este pacto —promovido por uma constelação de atores em ambas as regiões—. Nesse ponto, é importante ressaltar o papel crucial das organizações da sociedade civil no espaço birregional, cujo trabalho garantiu que o documento mantivesse seu impulso. Nessa linha, as contribuições dos movimentos feministas, das organizações internacionais e da academia são particularmente fundamentais, pois há muito impulsionam, problematizam e tornam visível a relevância inegável do cuidado para a sustentabilidade da vida.
O papel do contexto no avanço da agenda
O trabalho multissetorial que sustenta a elaboração deste documento articula-se e complementa a profundidade e o impulso dados às discussões sobre cuidado por plataformas regionais como as Conferências Regionais sobre a Mulher da América Latina e do Caribe. Organizadas pela CEPAL desde 1977, em coordenação com a ONU Mulheres desde 2020, essas conferências têm sido fundamentais para desenvolver uma linguagem comum e posicionar o trabalho de cuidado na ALC com projeção birregional e global. Elas foram decisivas para amplificar e coordenar vozes poderosas sobre o cuidado originadas da sociedade civil, da academia, das organizações internacionais e de governos em diferentes níveis.
Não é coincidência que o contexto pós-Covid —um fenômeno que, devido às crises sobrepostas que envolveu, foi descrito por especialistas em cuidado como uma sindemia— tenha proporcionado as condições para que a Conferência Regional sobre a Mulher de 2022 colocasse o conceito de sociedade do cuidado no centro de sua agenda, resultando no Compromisso de Buenos Aires. Nesse mesmo ano, a União Europeia lançou outro marco fundamental: a Estratégia Europeia para o Cuidado. Ambos os documentos, juntamente com outros precedentes não detalhados aqui por razões de brevidade, foram decisivos para preparar o terreno para a concretização desta iniciativa.
Também é importante reconhecer o papel dos governos locais de ambas as regiões, que em 2025 deram continuidade a esse diálogo no Fórum realizado em Bogotá poucos dias antes da Cúpula. Como é bem conhecido, os governos locais costumam ser o primeiro ponto de contato com as necessidades de cuidado nos territórios e buscarão desempenhar um papel na implementação do Pacto.
Outro aspecto notável é que o documento foi lançado sob os auspícios de um país latino-americano —a Colômbia— que atualmente detém a Presidência Pro Tempore da CELAC. Essa iniciativa está alinhada com a ênfase que diversos governos de ambas as regiões têm colocado no cuidado, tendo desenvolvido, ou estando em processo de desenvolver, sistemas integrais de cuidado.
No plano institucional, é significativo o papel desempenhado —e agora formalmente atribuído— à Fundação EU-LAC. Celebrando seu 15º aniversário, a missão da Fundação EU-LAC é precisamente construir pontes entre a Europa e a América Latina e o Caribe. Desde o início, a organização esteve envolvida no processo que levou ao Pacto, convocando e sistematizando diálogos multissetoriais, apoiando a identificação de boas práticas e facilitando uma série de consultas em conjunto com a Aliança Global pelo Cuidado. Também amplificou vozes para discutir temas como financiamento e recursos —por exemplo, no Pavilhão do Cuidado na Conferência sobre Financiamento para o Desenvolvimento realizada em julho passado, em Sevilha—, entre outras ações realizadas pela Fundação EU-LAC e sua Rede Internacional de Mulheres (EU-LAC WIN). Espera-se que a Fundação EU-LAC apoie essa rede e, como estipula o parágrafo 15 do documento lançado, apresente propostas concretas para serem consideradas pelas autoridades, de modo a avançar rumo a uma sociedade do cuidado, em colaboração com as partes interessadas pertinentes.
Além disso, outro marco essencial para consolidar essa agenda foi o pronunciamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos em meados de 2025, por meio da Opinião Consultiva 31/2025. Em sua decisão, a Corte reconheceu o cuidado como um direito humano autônomo em sua tríplice dimensão: o direito de cuidar, o direito de receber cuidado e o direito ao autocuidado. Isso abre caminho para um maior engajamento birregional no reconhecimento explícito do cuidado sob essa perspectiva. Há também espaço para aprofundar uma abordagem interseccional e para reconhecer melhor o cuidado comunitário. Esses dois pontos foram destacados pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil CELAC-UE e discutidos no Fórum da Sociedade Civil que precedeu a Cúpula.
O valor agregado do Pacto e próximos passos
Sem pretender ser hierárquico ou exaustivo, um dos maiores potenciais deste resultado reside em sua capacidade de estabelecer um marco concreto de cooperação sobre um tema social crucial: todos os seres humanos precisam —e continuarão precisando— de cuidado. Essa necessidade não está restrita aos extremos do ciclo de vida e/ou ao apoio que pessoas com deficiência possam requerer; ela se estende amplamente para tornar nossas vidas simplesmente possíveis. O Pacto, portanto, oferece um ponto de partida importante para aprofundar definições em torno do cuidado e avançar em medidas que respondam às crescentes necessidades de cuidado em ambas as regiões.
Outro aspecto significativo é que o texto incorpora o conceito de sociedades do cuidado, reconhecendo também sistemas de apoio —em consonância com a proclamação, pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2023, do Dia Internacional do Cuidado e do Apoio—. No que se refere à conceitualização e problematização da agenda, a ALC tem oferecido contribuições valiosas às discussões, incluindo, por exemplo, o reconhecimento do cuidado ancestral da terra e dos nossos ecossistemas, sem os quais não haveria vidas para cuidar.
Em suma, ainda há muito a ser analisado em relação aos resultados, oportunidades e desafios surgidos do Pacto, bem como para avaliar sua futura implementação. Após seu recente anúncio, este último ponto é um dos mais abertos. Ao mesmo tempo, é importante reservar um momento para celebrar esse avanço: ambas as regiões possuem agora um marco que não apenas facilita a negociação e a priorização do cuidado na agenda política com renovado vigor, mas também representa um posicionamento estratégico.
Essa agenda também deve enfrentar contestação; historicamente, ela sempre evoluiu dessa forma, o que enriquece a discussão. Igualmente, requer uma atenção cuidadosa para enfrentar suas limitações e preencher as lacunas que permanecem. Entre as áreas a fortalecer estão maior clareza sobre mecanismos de trabalho e implementação, aprimoramento da responsabilização, maior inclusão de vozes sub-representadas, instrumentos claros de monitoramento, alocação eficaz de recursos, ferramentas de financiamento e uma perspectiva que integre o vínculo inseparável e constitutivo entre o cuidado e as desigualdades estruturais de gênero, para citar apenas algumas.
No atual contexto geopolítico complexo, é realmente notável que um dos consensos alcançados entre as duas regiões diga respeito ao próprio cuidado. Este avanço não ocorreu de forma isolada; reflete claramente um esforço colaborativo entre múltiplos atores em vários níveis. Esse processo exigiu, primeiro, a criação de um espaço de diálogo e, depois, a manutenção do cuidado como uma prioridade política de alto nível.

Natalia Escoffier é pesquisadora doutoral na MSCA Doctoral Network LAC-EU: Understanding Latin American Challenges in the 21st Century. Cursa o doutorado em Ciências Políticas e Sociais na Universitat Pompeu Fabra e está vinculada ao Institut Barcelona d’Estudis Internacionals (IBEI), sob supervisão de Andrea C. Bianculli. Sua pesquisa examina como uma agenda regional de cuidado está sendo configurada na América Latina e no Caribe (ALC) e na União Europeia por meio de processos de governança multinível.
Como parte da rede doutoral, realizou um estágio profissional na Fundação EU-LAC no final de 2025, obtendo experiência direta com iniciativas relacionadas ao Pacto Birregional sobre o cuidado. É bacharel em Ciência Política (com distinção) pela Universidade de Buenos Aires, mestre em Desenho e Gestão de Políticas Sociais pela FLACSO Argentina e mestre em Gênero, Identidades e Cidadania pela Universidade de Cádiz, onde estudou como bolsista da Fundación Carolina.
As opiniões expressas neste blog são exclusivamente da autora e não refletem as opiniões da Rede EULAS.


Comentários